Alguns anos atrás meus pais se separaram. O juiz decidiu que a minha guarda e nossa antiga casa ficariam com minha mãe; enquanto meu pai, tomaria conta do terreno na praia e do carro. Uma divisão justa, eu diria. Mas não demorou muito para que mamãe decidisse vender a casa para que nos mudássemos... então assim o fez, em seguida comprando um terreno em outra cidade.
No começo eu não estava muito animado com a mudança, passaria o dia inteiro sozinho, pois os amigos que continha ficariam para trás quando a troca de cidade fosse feita. Contudo, como mamãe trabalhava o dia todo, meus dias seriam resumidos a solidão e tédio continuo. E assim foi.
Logo na primeira semana na casa nova, um pouco antes da hora de dormir notei algo interessante do outro lado da rua. Pela janela do meu quarto vi uma menina sentada na borda da janela do segundo piso da casa vizinha. Fiquei apavorado, não teria ela medo de cair dali? Até pensei em fazer-lhe essa pergunta pessoalmente, mas achei que era muito cedo para se sair pela vizinhança e tentar fazer amigos, então apenas deitei-me na cama — que ficava de frente para a minha janela e, consequentemente, também para a dela — e observei a coragem da jovem garota até pegar no sono.
No dia seguinte, por volta do mesmo horário, vi a garota outra vez sentar-se em sua janela. Achei engraçado, estava parecendo-me algo rotineiro, assim como o meu ato de passar o tempo observando a lua assim que se punha no céu. Será que ela fazia o mesmo? Ainda era cedo para perguntar.
Passados estes dois dias, no terceiro não foi a lua que atraiu meus olhos para fora da janela... Eu esperava vê-la de novo, estava me acostumando com sua lustre presença podendo ser vista da janela do meu quarto. Até então eu não sabia se ela também me notava, mas naquela noite isso se fez passar pela minha cabeça devido a um aceno de mão que ela direcionou a mim enquanto a observava. Fiquei envergonhado, mas devolvi a saudação e me retirei da janela, indo dormir após uma novidade em meus dias tediosos.
No dia seguinte, logo que a lua fez sua presença em um céu estrelado, corri para a janela a fim de ver minha nova amiga — ou amada — novamente. Porém, passaram-se algumas horas, mas ninguém apareceu na janela da casa vizinha. Fiquei preocupado, um milhão de coisas passaram-se pela minha cabeça... "Ela estaria doente?", "Seus pais haviam advertido-a sobre os perigo de cair da janela?", "Ela estava dormindo?. Eram perguntas que cansaram-me de ficar sem resposta, então acabei decidindo visitá-la.
Após atravessar a rua e tocar diversas vezes a campainha, um grupo de quatro garotos que vinha passando pela rua de bicicleta aproximou-se para me perguntar o que estava fazendo.
— Vim ver uma amiga. — respondi.
Mas logo em seguida, todos os quatro olharam-se entre si e responderam quase em coro uma frase que me arrepiou dos pés à cabeça:
— Esta casa está a dois anos abandonada.
Não acreditei, deveriam estar confundindo a residência com outra casa. Ela era tão bem cuidada, bem pintada e eu havia visto aquela garota bem arrumada na janela. Casas assombradas não teriam tais características... Ou teriam? Foi o que eles me responderam.
— A garota que morava aí suicidou-se da janela do seu quarto no segundo piso, se você parar bem debaixo da janela ainda pode enxergar a marca da poça de sangue de onde ela caiu. A mãe dela vem todo mês cuidar da casa, pois acredita que o espírito da filha ainda está por lá.
Fiquei em choque, mas me pus debaixo da janela para comprovar se a história era verdade. E para a minha infelicidade, ela era. Agradeci aos garotos pelas informações e fui atravessando a rua para voltar para casa, mas antes mesmo que eu atravessasse por completo, um dos garotos chamou minha atenção e me falou uma última coisa.
— Ei... Você não é o primeiro a ver ela, então, fique longe da janela...
Concordei acenando a cabeça, me faltavam quaisquer palavras com as quais eu pudesse responder. Então retornei para casa e me deitei em minha cama, sabendo que naquela noite teria problemas para dormir, agarrei algum livro na estante a fim de tentar concentrar meus pensamentos em algo que não fosse a garota que antes observava. Bom, pelo menos eu tentei.
Não demorou muito para que eu tivesse a brilhante ideia de pegar uma rosa vermelha do vaso de flores de mamãe e levá-la até o outro lado da rua, até a marca de sangue da suicida à qual eu admirara durante três noites seguidas. Pus a rosa no chão e voltei para casa, pegando meu livro novamente em mãos e sentindo minha mente um pouco menos pesada. Talvez àquilo ajudasse o espírito da jovem moça a descansar...
Alguns minutos foram se passando e quando no relógio bateu 23:00 em ponto, ouvi a campainha tocar duas vezes, seguido de algumas batidas na porta. Imaginei ser minha mãe voltando do serviço e corri para atender, mas não havia ninguém do lado de fora, não vi nada além da neblina da noite que fez com que o frio passasse pela porta. Então imaginei ser alguma criança fazendo travessuras ou o sono me pregando peças e voltei para o quarto, a fim de voltar a ler meu livro até que minha mãe chegasse do trabalho. Acontece que, assim que entrei pela porta vi algo que me assustou muito em cima da cama...
A mesma rosa cuja eu havia deixado do outro lado da rua estava exposta em cima da cama, sobre o livro, como se fosse um aviso de que alguém havia entrado. Corri até a janela afim de espiar a rua e ver se a rosa que eu colocara em cima da calçada estava lá — eu ainda tinha esperanças disso —, mas antes mesmo que eu focasse meu olhar em algo, uma risada feminina fez-se ouvir pelo quarto. Quando tentei virar para ver quem seria, mãos invisíveis me empurraram, e eu caí da janela.
Eu deveria ter me lembrado do conselho do garoto, deveria ter ficado longe da janela. Se eu tivesse lhe dado ouvidos, eu não estaria aqui, agora, com ela... observando a lua,
da janela...
Nossa, esse me deu arrepios
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