A Impostora [Parte 3]

Capítulo anterior: https://psicontosonline.blogspot.com/2018/05/a-impostora-parte-2.html
.

― Por quê você fez isso? Por quê, Nicolle? ― mamãe me disse, entre lágrimas, quebrando o silêncio que pairava pelos ares da casa desde que eu entrara pela porta.

  Eu não sabia o que responder, desde a morte da minha irmã eu nem sequer havia tocado naquele diário, não conseguia nem imaginar o que de tão grave pudesse haver escrito nele. Sempre achei que fosse o inofensivo caderno de uma adolescente, daqueles em que elas escrevem sobre os rapazes de quem gostam, namoram ou... você sabe... ― digamos que eu não estava totalmente errada.
  Mamãe e eu ficamos alguns instantes nos encarando. Havia uma interrogação em minha mente, uma decepção na de mamãe e o mistério de o que minha irmã havia feito rodeando à minha volta. Mas não demorou muito para que minha mãe largasse o caderno em cima da cama, se levantasse e se direcionasse à saída do quarto, me jogando uma frase de julgamento, uma frase que eu jamais irei esquecer.

― Você é um monstro!

  Esperei ela sair e corri em direção ao caderno. Ele ainda estava aberto na parte em que mamãe estava lendo, então, apenas me sentei na cama e também me pus a bisbilhotar as escrituras de Nicolle... Cujas aos olhos de mamãe, eram as minhas escrituras.

┏━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━
┖─► 17/03/2017

  Tracy... Foi Tracy quem ficou com David. Eu sabia! Tinha alguma coisa de errado com aquela garota quando a vi no refeitório segunda-feira.
  Eu fui tola por não ir àquela festa. Se ao menos tivesse aparecido por lá, nada disso teria acontecido. David estava tão perto de ser meu... estávamos quase mudando o fato de termos uma relação sem compromissos. Eu deveria ter ido àquela festa... Droga! Eu deveria ter ido! Preciso fazer alguma coisa, não posso deixar as coisas como estão. Não sou mulher para ser "traída" e David deveria saber disso... ele com certeza deveria saber.

┖─► 18/03/2017

  Visitei a Tracy hoje à tarde. Assim que ela me atendeu a porta pude perceber que minha visita a incomodava. Talvez ela temesse que minha intenção fosse esfaqueá-la ou algo assim, pois pude perceber que estava meio trêmula e assustada com minha presença. Ela me convidou para sentar no sofá e perguntou a o que devia a honra de minha visita.

― Ah, Tracy... nem que minha presença fosse mesmo algo a se agradecer, todos sabemos que honrada você não é nem um pouco! ― foram algumas das últimas palavras que ela ouviu em sua vida, afinal, ela estava mais do que certa de se assustar ao me atender a porta; estava mais do que certa se desconfiava que houvesse uma faca escondida às minhas costas pronta para adentrá-la.

  Assim que ela virou-se de costas caminhando em direção ao aconchegante assento que decorava sua sala, lhe desferi o primeiro golpe, fincando a faca em suas costas, na região da coluna, na altura do ombro. Ela ergueu a cabeça, paralisada por alguns segundos devido àquele ataque "surpresa". Garota estúpida! Qualquer um sabe que não se dá as costas a um inimigo.

― O interesse de David nessa vadia só pode ter sido voltado para sua vagina, porquê cérebro(inteligência) ela não parece ter nenhum. ― pensei, rindo internamente enquanto afundava cada vez mais a faca nas costas de Tracy, até que a única parte visível fosse o cabo do objeto e a lâmina estivesse totalmente cravada na pele dela.

― David era meu... ― susurrei em seu ouvido enquanto retirava a faca de suas costas, puxando de volta minha arma do crime.

  Após isso lhe esfaqueei mais algumas vezes até que a visse sem vida e caída ao chão. Por um momento, questionei o que havia acabado de fazer, se realmente estava certo culpar a garota pelas infidelidades de um rapaz que nem meu namorado era ― apesar dos meus sentimentos por ele e desejo de que fôssemos um casal ―, mas já estava feito, não havia mais como voltar atrás. E, sendo bem sincera... ao mesmo tempo em que questionei-me do ato cometido, também me senti satisfeita por tê-lo feito.

  Então, minha conclusão é de que agora eu entendo as razões pelas quais assassinos tanto de filmes que assisti; quanto da vida real optam por sanguinolência como diversão ou vício. Havia uma certa magia naquilo, algo indescritível. Sentir o poder de uma vida em suas mãos... a adrenalina de perpetrar algo para o próprio prazer... foi algo maravilhosamente indescritível, e eu não vejo a hora de fazer de novo. David também precisa pagar por me fazer de tola, e talvez essa seja uma boa razão para eu voltar a brincar com sangue.

━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━━┛

  Quando terminei de ler a folha, fiquei pasma diante de tal segredo de minha irmã. Mas aquilo era um diário grande, e se eu já estava apavorada com o que havia na metade dele, mal podia imaginar o que nas outras páginas me esperaria.
  Eu não sabia que Nicolle estivera envolvida com um rapaz e muito menos que era capaz de esconder algo assim de mim... Eu até fiquei um pouco magoada com isso, mas ao mesmo tempo comecei a imaginar-me matando a garota no lugar de minha irmã. Essa foi a prova definitiva de que meu delírio estava cada vez maior.
  A ideia de que eu era realmente Nicolle estava se alimentando cada vez mais durante minha farsa. Eu já estava em um nível tão alto de loucura, que diante dessas minhas imaginações começou a surgir um tipo de remorcio pelo o que li. Porém, não demorou muito para que este sentimento desse lugar a preocupação. Preocupação por mamãe ter saído do quarto às pressas, preocupação pelo o que ela iria fazer em relação àquilo. Ela seria capaz de entregar sua filha ― preferida, lembre-se de que aos olhos dela eu era Nicolle ― para a polícia? Ou será que ela encobriria o acontecido e protegeria sua única herdeira viva de uma sentença criminal? A resposta correta eu não sabia. A única coisa que eu sabia, era que no final mamãe estava certa ao julgar por aquela frase. Nicolle era mesmo um monstro, um doentil e inconsequente monstro... E, como eu estava me tornando ela, era só questão de tempo para que me tornasse ele.


Comentários